Yasunaka , Suejiro (Sapporo - Ilha de Hokkaido, Japão - )

Vida: 
1901 a 1988
País: 
Japão
Autor: 
Daniel Choma
Edson Luiz da Silva Vieira
Tati Costa
Campo de atuação: 
Retratos fotográficos
Fotografia documental
Serviços de estúdio
Registro de eventos
Produção de álbuns comemorativos
Trajetória fotográfica: 
Photo Yassunaka
Foto Estrela
Destaques: 
Álbum comemorativo aos vinte anos da Colônia de Iguape
Álbum comemorativo dos dez anos da Fazenda Bastos
Revelações da História: o acervo do Foto Estrela

 

Suejiro Yasunaka nasceu em 1901 e iniciou sua relação com a fotografia na década de 1920, na cidade de Sapporo - Ilha de Hokkaido, Japão. Sua incursão nos conhecimentos desta arte e ciência se deu no convívio diário com Abe Gueitiro, na casa de quem residiu por quatro anos, prestando pequenos serviços domésticos em troca do aprendizado do ofício de fotógrafo. No último ano de sua formação, viu seu mestre falecer, deixando mulher e filhos órfãos. Em consideração e gratidão, Suejiro assume os trabalhos de Gueitiro e o sustento da família dele. Após ensinar ao menino mais velho o ofício do pai que partiu, monta um estúdio e laboratório fotográfico próprio na mesma cidade. Mas logo percebe que, por sua maior experiência e contato com a comunidade, seu negócio acabava por roubar os clientes do foto da família Gueitiro, fazendo-o desejar a mudança para outra cidade.

Em 1928 já estava casado com Shizu e tinha um filho com um ano de idade, Yutaka. Segundo o próprio Yutaka me relataria setenta e oito anos depois, a propaganda de estímulo à migração para o Brasil atraiu seus pais, que então empreenderam a viagem, cruzando os mares entre os portos de Kobe e Santos a bordo de um navio e fixando-se em Registro-SP. O pretexto era de que viriam para trabalhar nas lavouras de café por no mínimo dois anos, pois esta era uma das principais condições para se obter a permissão (e o incentivo) para emigrar do Japão para cá [1]. A família cumpria os critérios de migrar em grupo, mas não pretendia o trabalho na terra. Tanto que seis meses após a chegada ao Brasil, Suejiro já havia se estabelecido como o fotógrafo da colônia de Registro, fundando em 1930, ele e sua família, o Photo Yassunaka. 

Na Colônia Iguape-SP, iniciou trabalho fotográfico que se repetiria em Bastos-SP. Além dos serviços de estúdio e registro de eventos, a produção de álbuns comemorativos - cuja narrativa de memória tem em si a aura da aventura. A cavalo, portando pesado equipamento fotográfico – a câmera e o tripé eram de madeira maciça e os negativos, chapas de vidro sensibilizadas em processo manual – Suejiro percorreu as trilhas das duas colônias, oferecendo de casa em casa seu serviço de fotógrafo e registrando o ofício de dezenas de famílias japonesas recém chegadas ao Brasil. O trabalho realizado por ele entre 1929 e 1938 resultaria na publicação de um álbum em comemoração pelos 20 anos da Colônia de Iguape, e outro em comemoração pelos 10 anos da Fazenda Bastos.

Tanto o álbum de Registro-SP (publicado em 1933), como o realizado em Bastos-SP (publicado em 1938), demandaram cada um cerca de três anos de empenho por parte de Suejiro. Foi o filho Yutaka quem guardou as duas grandes obras produzidas pelo pai e que nos permitiram, em 2005, conhecer os materiais, fragmentos de um passado ainda presente.

O álbum comemorativo aos vinte anos da Colônia de Iguape - 1933 (atualmente município de Registro, São Paulo) tem 180 páginas, aproximadamente 520 fotografias impressas no processo de litografia[2] em papel de boa qualidade. O álbum tem bom acabamento, com capa dura e costura especial. Os textos estão em japonês e as legendas das fotos são bilíngües. A orientação da leitura do álbum é no modo oriental, ou seja, da esquerda para direita. Este álbum foi financiado pela Kaigai Kogyo Kabushiki Kaisha (Companhia Ultramarina de Empreendimentos S. A.), empresa responsável pela imigração japonesa no Brasil. Mas ao que tudo indica, os imigrantes também contribuíram para publicação em troca de publicidade.

Até o momento, pudemos nos debruçar mais demoradamente apenas sobre o material de Bastos[3]. Um impresso que nos permite múltiplas leituras, abrindo pesquisas para as áreas de migração, gênero, fotografia, família, moda e política. 

O título da capa “Álbum comemorativo dos 10 anos da Fazenda Bastos” aparece em português, impresso em relevo dourado. As iniciais SCB - Sociedade Colonizadora do Brasil – aparecem impressas no canto superior esquerdo, também com relevo dourado. Mas segundo Yutaka Yasunaka, a SCB não foi a única patrocinadora do material. Os custos da publicação foram rateados entre a SCB e a comunidade da colônia de Bastos, que queria se ver representada no álbum comemorativo.  Organizado em 214 páginas, com impressão gráfica monocromática (preto e branco), páginas internas em papel de seda liso e capa dura com encadernação costurada, sugerindo uma navegação ao modo japonês, a leitura do álbum se inicia pelo verso, ou seja, pela contracapa.

Um material comemorativo que firmaria representações para a posteridade. A narrativa construída por Suejiro através de fotografias e legendas constitui uma fonte aberta a múltiplos discursos em seu entorno. Após uma fotografia panorâmica da Vila Bastos, um mapa situando geograficamente a colônia e registros das principais estruturas da região (a estação ferroviária de Rancharia, a estrada entre Rancharia e Bastos, o auto ônibus, escola, delegacia), cada página passa a apresentar um estabelecimento comercial ou uma família em especial, havendo em média entre três e seis fotos em cada página. Pode-se inferir sete categorias temáticas, definidas de acordo com os contextos predominantes das imagens, sendo elas: retratos de família; lavoura; retrato-destaque; comércio; rua e lazer; fabril; instituições de serviço público. Com predominância de retratos de família, seguido das imagens realizadas na lavoura. O comércio, que particularmente interessava aos imigrantes japoneses na busca pela ascensão social, aparece em seguida, mas com uma pequena participação.

Em 1928, quando no Brasil continuava-se a varrer sertões imaginários e o café era o principal produto de exportação, no Japão Suejiro Yasunaka já trabalhava com fotografia, uma atividade ligada principalmente ao modo de vida urbano. A preservação deste álbum após 70 anos de sua publicação é um ato louvável da parte de Yutaka Yasunaka. O material merece um trabalho aprofundado de restauro e pesquisa: tradução de textos em japonês, análise de discursos, digitalização das páginas e tratamento das imagens - pois apesar de sua duração o material é frágil, a capa está cedendo, páginas estão rasgadas e amareladas.

Segundo relatos de seu filho Yutaka, a iniciativa pagou apenas pelos gastos de produção. Em 1939, incomodado com as perseguições à cultura japonesa no Brasil, em decorrência da Segunda Guerra Mundial, Suejiro decide retornar com a família ao Japão, onde permanece trabalhando com fotografia até que, em 1951, as difíceis condições de vida no pós-guerra motivam a família a emigrar, dessa vez, definitivamente, para o Brasil. A família de Suejiro e Shizu contava então com oito filhos, e estabeleceu-se em Marinalva-SP, em busca de oportunidade de trabalho no campo da fotografia. Na época, o filho mais velho, Yutaka, já se formara no mesmo ofício do pai e, de acordo com a tradição japonesa, tinha a responsabilidade de ajudar no sustento e chefia da família. Através de uma amiga, a família soube do interesse de Carlos Stenders em vender seu estabelecimento em Londrina-PR, o Foto Estrela[4]. Negócio fechado com a família Yasunaka, que passa a residir em Londrina a partir de 1952.

Suejiro Yasunaka manteve o Foto Estrela durante toda sua vida, ao lado de seu filho primogênito, Yutaka. Dois filhos de Suejiro seguiram sua profissão, o mais velho Yutaka Yasunaka herdou o Foto Estrela e o manteve em atividade em Londrina até 2008. E o caçula Mario Yasunaka fundou em São Vicento seu próprio negócio, com o mesmo nome. Os dois se consolidaram como importantes fotógrafos das suas regiões. Neste sentido, a saga da família Yasunaka e sua relação com a fotografia por si justificam amplas pesquisas, relevantes para a formação do inventário visual nipo-brasileiro.


[1] No acordo entre os dois países, o Brasil pagava as passagens de terceira classe em navios e as despesas da viagem eram custeadas pelo fazendeiro, que depois as descontavam do pagamento aos trabalhadores. Ver SAKURAI, 1999. Conto ainda com uma abordagem na perspectiva das teorias migratórias, ver ASSIS, SASAKI, 2000.

[2] As páginas desta publicação são impressas em uma face apenas. Deste modo cada página é um original litográfico.

[3] O álbum de Iguape seria emprestado à comissão organizadora do Centenário da Imigração Japonesa.

[4] Estabelecimento comercial que agregava loja de produtos e insumos fotográficos; laboratório de revelação e ampliação e estúdio fotográfico. O acervo do Foto Estrela esteve anônimo até 2006 quando a iniciativa cultural “Revelações da História: o acervo do Foto Estrela”, financiado através da Lei Municipal de Incentivo à Cultura da cidade de Londrina possibilitou a recuperação, catalogação, acondicionamento e reintegração do acervo na sociedade.

 

Referências: 
ASSIS, Gláucia de Oliveira; SASAKI, Elisa Massae. Teorias das migrações internacionais. Gt de Migração. Caxambu, MG, ABEP: 2000.
CHOMA, Daniel; COSTA, Tati; VIEIRA, Edson Luiz (orgs.) Revelações da História: o acervo do Foto Estrela. 2ªed. Londrina: Câmara Clara, 2012.
_____. A presença de japonesas e japoneses imigrantes nas imagens do álbum do 10º aniversário da colônia de Bastos, SP - 1938. Revista Temporalidades, Belo Horizonte, v.1, n.1, (jan./jun. 2009), p. 173, 2009.
SAKURAI, Célia. Imigração Japonesa no Brasil: um exemplo de migração tutelada. In: FAUSTO, Boris (org). Fazer a América. São Paulo: Eduscp, 1999. p 201-239.

 

 

ISBN: 978-85-63735-10-2